Vou aproveitar para falar de amamentação, assunto que nunca pode sair de moda. Aconselho cuidado com plásticas em mamas e silicones. Complica. Acompanhei duas histórias de silicones em mamas que se romperam e causaram muitos problemas. Quanto mais tempo se demorou para fazer o diagnóstico, mais problemas causaram. Plástica, na maioria das vezes, atrapalha a amamentação. Atrapalha a fluência da descida do leite.
Mamar deve ser de acordo com a fome biológica e, nunca, com a fome cronológica, ditada por um relógio. Um bebê saciado, num ritmo próprio, se apropria com mais facilidade de si. A necessidade corresponde à saciedade e isto organiza a matriz do ritmo. Estamos, principalmente nos primeiros 4 meses de vida, organizando nossa matriz rítmica. No útero, na unidade com o corpo da mãe, matriz ancestral, não há ciclos. Noite e dia ainda não se diferenciam. Fome e saciedade também não. Apesar de nossa estrutura ser da alternância, portanto, cheio e vazio, do nascer ao morrer, amadurecemos aos poucos estes sistemas.
Ao nascermos, entra o primeiro sopro vital, e corta-se o suprimento materno via placenta e cordão umbilical. Cortamos uma unidade, para iniciarmos nosso tempo de dualidade. Portanto, precisaremos construir nossa matriz de ritmo circadiano, noite e dia, fome e saciedade. Passar do tempo do absoluto, sem dualidade, sem fome, para um estado de total dependência ainda, simbiótica, porém com a fome. Ai, dá trabalho… Esta transição deve ser de muita delicadeza. Devemos ter muito respeito com a fome biológica, a fome de cada um, de cada momento. Não concordo com a ditadura do horário cronológico para amamentar. A fome é do bebê e não é da mãe, nem do pai, nem da avó, nem da enfermeira.
Segundo a espiritualidade indígena, nossa primeira morte é ao nascermos. Morre nosso ser de água. Nasce o ser do ar, portanto ser do vazio e do som, ser da linguagem e da falta. Nosso primeiro ancestral somos nós mesmos, nosso ser de água.
Ao nascermos, nossa alma sensível se ancora nos pulmões e nossa alma etérica (da individualidade em dons e missão), se ancora em nosso fígado. Assim pensa a medicina tradicional chinesa e eu também. Alma aqui quer dizer também matriz de auto-organização, individual, com memória e heranças, mais um vazio enorme, o criativo por fazer.
Os taoístas, entendem a estrutura com um princípio claro: tudo que enche, esvazia. Tudo que esvazia, enche. (Para saber mais sobre a filosofia do TAO-TE KING, ver diário de práticas corporais chinesas, de Maria Lúcia Lee ).
Portanto, quanto mais espontaneidade existir entre o esvaziar e o encher, mais originalmente e num ritmo próprio, apropria-se o ser, e com menos desvios esta matriz se organizará. Com mais saúde, com certeza. Com menos choro, com menos cólica, menos catimba, mais decifração.
A saúde mental já começa no útero. Precisamos cuidar dela o resto da vida. Se pudéssemos compreender nossos desejos, nossos ritmos pessoais… Dormir quando se tem sono, comer quando se tem fome, despertar quando chegar a hora. Ah, isto seria o máximo… Economia corpórea, vitalidade mais garantida. Prazer mais respeitado, certamente, gera menos gozo e mais confiança. O gozo, segundo a psicanálise, tem mais a ver com suplência da falta e muito menos com desejo, que é feito de falta.
Além dos horários livres de mamadas, recomendo também o orgasmo das mamadas. Todas as mães que amamentam ou amamentaram reconhecem este momento. É preciso concluir a mamada até seu êxtase. Nessa hora o bebê revira os olhos, pende o pescoço, amolecendo todo o corpo, baba leite no cantinho e dorme uma soneca, as vezes de minutos. Este é o sinal que a mãe precisa para ter certeza que ele ficou bem nutrido, em vários níveis, sutil e organicamente. Todo este relaxamento visível no externo acontece também internamente, liberando gazes e fezes, com o relaxamento inclusive do esfíncter anal. Isso minimiza cólicas do recém-nascido. Por isto, a mãe não deve interromper a mamada de um peito para passar ao outro, antes deste momento precioso.
Reconhecendo-nos como seres do prazer, desejo e falta, fome e necessidade, ganhamos coragem e confiança de que podemos buscar a satisfação, pois a fome voltará. No entanto, existe aquele instante de atingir a plenitude, mesmo sendo ela transitória. Vem no pacote, a mensagem de que a vida vale a pena.