A criança até 3 anos não precisa de escola. Muitas vezes, a escola é muito agressiva antes dessa idade. Atendi uma criança que, com 2 anos e 6 meses, começara a escola, com um número grande de crianças na turma. Já há 2 meses chora para entrar, avisando que não quer escola. Como não foi ouvida, iniciou uma sequência de adoecimentos, com falta de apetite, choro noturno e angústia. Estava realmente desvitalizada, sem brilho e pálida.
Depois de muita conversa com ela e com seus pais, convenci-lhes a dar um tempo e pensar em outra estratégia de vida. Resultado: rapidamente sarou e voltou ao que era. A mãe disse:
– Nossa, ela estava murcha. Entendi agora o que é ouvir uma criança.
O modelo que uma criança busca de referência são seus pais. Tudo que interessa a ela é ver como pai e mãe funcionam. Como eles vivem e se inventam. Isso é o precioso no início de uma construção de matriz de funcionamento. O social vem depois. A referência coletiva, a experiência coletiva, vem depois. Não podemos inverter esta ordem. Imunologicamente não é possível.
Ouvir uma criança é o melhor que podemos fazer. Durante quantos anos na humanidade a posição da criança com relação ao seu desejo foi negligenciada? Entendendo a manifestação do sintoma físico, vejo que a criança fala, grita, adoece, como recurso de expressão do que está em desconformidade para sua necessidade, ou qualidade de viver. Não custa nada parar para ouvir.
Temos planos e projetos para os filhos, mas a decisão final depende da experimentação do ser. Quem experimenta são eles, e não nós. Temos uma ideia muitas vezes imaginária do que se passa ali, onde estão e de como estão vivenciando a experiência. Ouvir é mais barato do que cuidar do sintoma físico.
Gostaria muito de chamar de outro nome, diferente de doença, estes sintomas feitos pelas crianças no apuro de situações difíceis para elas. São saídas incríveis para a pequena possibilidade de decisões que eles têm. Alguém deve ouvir, para traduzir a mensagem corretamente e assim aprender a fazer leituras corretas. Com certeza, crianças mais ouvidas, mais compreendidas, saberão ouvir e compreender melhor o outro, trazendo maior possibilidade de ética para nosso planeta. O futuro depende delas.
Usando autoridade e não autoritarismo podemos participar da construção de alteridades.