Como tenho observado, a morte é um tema para as crianças, principalmente após 4 anos de idade. Hoje atendi uma criança com 8 anos, queixando-se de dores de cabeça há mais de 3 semanas, que não aparece enquanto ela dorme, nem vem com outros sintomas adjacentes como catarro, febre, vômitos. Ela trouxe uma tomografia cerebral pedida por uma neurologista que estava normal. No momento, sua vida está razoavelmente tranquila. Disse a mim que não costuma falar o que sente. Tenho a dica da leitura corporal que indica que a cefaléia se relaciona com o controle de emoções. Esse é um garoto de padrão obsessivo, bastante controlado e contido. Já teve, aos 5 anos, sintomas obsessivos compulsivos (T.O.C) tratados na off-sina terapêutica (trabalho de ludoterapia que criei com orientação da psicanálise, com pequeno grupo de crianças e outros profissionais). Desconfiei que o tema da morte pudesse estar por trás do sintoma cefaléia. Fiquei a sós com ele e lhe pedi que contasse um sonho e ele, com dificuldades contou:
– Alguém queria matar meu pai e minha mãe e eu tive que implorar para ele que não matasse.
Dizia:
– Por favor, por favor, por favor!!!
A partir de 7 anos a consciência amadurece, tornando mais clara a força do real. Este garoto, por exemplo, entendeu e se entristeceu com a não existência do papai noel. Teve o “insight” da morte, que se impôs como um fato possível. Daí veio uma enorme angústia, que nem sempre pode ser mencionada, como o medo da morte dos pais. Uma saída é tentar esquecê-la, sem conseguir, é claro. No sonho, onde nosso controle desaparece, aparece o medo real. O sintoma cefaléia sinaliza aqui, a tentativa de controlar este sentimento que teima em ficar.