Atendi um garoto de 3 anos de idade com queixas constantes de dor de cabeça. O sintoma não me pareceu ser orgânico por várias características. Conversando com a mãe, soube que ela andava bastante incomodada com a professora dele por causa de sua rigidez. O mais grave foi que ele havia desenhado uma girafa e a coloriu com a cor verde, e a professora não permitiu, dizendo que todas as girafas são amarelas. Ele estava muito infeliz com isto (e eu não engoli este autoritarismo castrador). Quando fui examiná-lo, retirei seu sapato e suas meias. Para minha surpresa, sua meia tinha uma estampa de uma girafa VERDE. Eu lhe mostrei a girafa verde em sua meia, dizendo-lhe que era possível sim pintar uma girafa de verde. Ele sorriu aliviado. Não soube mais de dores de cabeça nessa criança.
Entre 3 e 6 anos, as crianças já estão em uso da linguagem, com habilidade para a metáfora e sua dimensão simbólica. Precisam ter chance de se expressarem livremente, para representarem, de modo pessoal, a maneira como vêem o mundo, os objetos e as pessoas. Nada precisa de nota, nem de certo e errado, nem de estratificação de qualidades. Não devem ser limitados na simbolização. Mais tarde, a realidade terá peso normático. Essa liberdade para simbolizar será extremamente importante depois em diversos aspectos, inclusive para o pensamento abstrato ser bem desenvolvido. Existe uma relação muito íntima e curiosa com a restrição da simbolização e as atitudes de rivalização. Se em algum ambiente, as crianças estiverem se rivalizando muito, pode ser que esteja faltando ou tenha faltado, liberdade e estímulo para a metaforização. Se já forem adultos, a dica também é válida. NUNCA É TARDE PARA A POESIA E A METÁFORA.